01 junho 2016

Crônica

É verdade, eu te compraria

 



     Acordei, olhei para o lado e tudo que vi foi o vácuo e o lençol branco amarrotado.  Olhei para mim mesma, já não vestia mais aquela sua camisa cinza com cheiro daquele perfume importado que eu tanto gostava. 
     
     Levantei, apoiei os pés no piso envelhecido e procurei por seu chinelo, mas tudo que encontrei foi minha pantufa de panda, que ainda estava com aquela mancha de café que você derrubou. Fui ao banheiro, que já não emanava aquele cheiro de loção pós-barba e nem possuía seu samba-canção pendurado no lugar das toalhas. Tomei um banho, a banheira nunca esteve tão espaçosa e vazia. A espuma e as pétalas não foram suficientes para cobrir o espaço causado por sua ausência.
     
     Arrumei-me de um jeito mais mal arrumado possível. Continuei com o cabelo amarrado em rabo de cavalo, pois você não estava ali para implicar comigo e mandar soltá-lo. Entretanto calcei aquela alpargata amarela que você me deu no verão passado. 
Não sentia fome, mas fui à padaria mesmo assim. Não iria pedir o de sempre, apenas um café amargo para me manter acordada. Apesar do turbilhão que se encontrava minha vida, era melhor ficar desperta ao invés de ir ao encontro de pesadelos que insistiam em me atormentar toda vez que eu fechava os olhos.
     
     Na volta para casa, estava passando por aquela praça que costumávamos ir ver o pôr do sol, quando notei uma pequena loja em frente, cuja o logo dizia “tudo que você precisa, encontra-se aqui”. Corri até lá, e adentrei aquele lugar.
     
     Notei que havia roupas, sapato, produtos de beleza, perfumes e tudo mais, menos você. Comprei várias coisas, mas mesmo com todo o dinheiro que tinha, dinheiro esse que foi fruto de dedicação e trabalho, não poderia comprar o que eu verdadeiramente precisava, pois ao contrário do que dizia o logo, ali não havia o que eu procurava. Mas às vezes compramos por impulso na tentativa tola de trazer felicidade, acontece que a felicidade não esta a venda. Não há dinheiro que compre felicidade.
     
     Meu dinheiro poderia comprar tudo que havia ali, mas não compraria sua companhia no meu dia-a-dia e nem teu sorriso. Não compraria o carinho que você me fazia e nem os elogios que me dava. Não compraria sua voz e nem o seu amor. Não compraria a morte, pois assim como você e a felicidade, esta também não está à venda.
     
     Mesmo com o tanto de dinheiro que eu tinha, o máximo que eu poderia fazer era sair dali e ir direto para a floricultura da esquina, e comprar margaridas, sua flor favorita, para deixar em seu túmulo. Não que bastasse. E depois voltar para casa, sabendo que nenhum dinheiro no mundo pagaria a dor que eu sentiria por viver em um mundo em que você não mais existia.  

Isadora Martins


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