20 agosto 2016

Crônica


Deixei a porta aberta, caso queira voltar

 




             Era o primeiro dia da tão esperada férias quando um ser humano desconhecido veio falar comigo. Ok, “ser humano desconhecido” é um termo estranho, fato é que era um ser humano bem bonito, com uma barba maravilhosa, com bom gosto pra música e livros... Certo, chega de elogios.

  Pois bem, estava eu deitada,assistindo netflix, quando esse moço veio conversar comigo. Não tínhamos ideia de como ele tinha o meu WhatsApp, e ele surgiu com a seguinte pergunta: “Quem é você?”

            Era uma boa pergunta, tão boa que nem eu sabia a resposta. Quem era eu? Uma garota que tem uma terrível mania de acreditar no melhor das pessoas? Que não vê maldade nas coisas e que ainda acredita no “Felizes para sempre” mesmo sabendo que é tudo ficção? Uma garota que fica de pijama o dia todo, e que às vezes deixa de frequentar lugares sociáveis por preguiça de arrumar o cabelo? Que opta por ficar em casa numa sexta à noite vendo séries ao invés de ir em baladas tentar preencher o vazio com pessoas e bebidas e prefere se preencher com pizza? É, talvez eu seja essa garota, mas ele não precisava saber disso, então respondi “qualquer coisa” e seguimos conversando.

Conversamos tanto, que a conversa se estendeu ao longo dos dias. Quando notei, havia uma semana de conversa diária, muitas risadas, muitas descobertas de coisas em comum, muitas músicas compartilhadas. E aos poucos um estranho que poderia ser um psicopata acabou se tornando um amigo, ou era o que eu pensava.

Minha mãe costuma dizer que não devo conversar com estranhos, mas não a levo muito á serio já que a mesma conta a sua vida para um desconhecido na fila de um banco. Então, após uns quinze dias, resolvi aceitar o convite dele para sairmos e nos conhecermos pessoalmente.

Esse é aquele momento que você vai pensar que este é um relato de pedofilia ou sei lá, mas não, ele era apenas ele mesmo. Ainda me lembro como se fosse hoje, de avistá-lo na praça de alimentação me esperando, na verdade, eu cheguei bem antes (foi a primeira vez na vida que não me atrasei para um encontro), mas fiquei em um lugar diferente do combinado. Ainda me lembro do que senti quando nos encontramos e nos abraçamos, e não, não foi um sentimento romântico, foi algo parecido com querer sair correndo. Sou louca? Talvez.

No primeiro momento, tentei me convencer de que era tudo culpa da minha timidez que eu nem sabia que tinha. Mas com o passar do tempo, e do silêncio constrangedor, cheguei à conclusão de que eu fui precipitada, que deveríamos ter nos conhecido melhor antes de sairmos. E a cada segundo que se estendia lentamente, eu torcia para passar mais rápido e para a noite acabar logo para que eu pudesse voltar pra casa.

Sabe, às vezes vejo a vida como aquele pote de sorvete que você esconde na geladeira para comer quando voltar da escola. Você passa toda a aula ansiosa para chegar em casa só para poder devorá-lo, mas quando finalmente volta pra casa e abre a geladeira, devora o sorvete e percebe que o conteúdo não era tão bom quanto imaginara. É frustrante. Talvez tenhamos sido assim, um para o outro.

Até hoje tento entender aquele encontro, aquelas tentativas de conversa; aquele beijo de 5 segundos e que julgo ser o beijo mais rápido na história dos beijos; aquela timidez e indiferença; aquele jeito de partir sem se despedir direito. Até hoje tento entender onde erramos, onde eu errei e qual foi o problema.

Talvez O problema tenha sido eu não conseguir ser eu mesma por medo de desagrada-lo, mas foi tentando não desagradá-lo que me protegi em uma redoma invisível onde me mantive distante, mostrando-me uma garota diferente de nossas conversas. Talvez o problema tenha sido sermos tão precipitados em certas coisas e tão indiferentes em outras. Talvez o problema seja só ter enxergado isso na hora que eu estava indo dormir, quando revivo mentalmente meu dia e minhas paranoias e erros cometidos em 2003. Ou Talvez o problema tenha sido não fazer nada para mudar as coisas.

Que tipo de pessoa é louca para gostar tanto de alguém em apenas 15 dias? Que tipo de pessoa ainda se apega a certos acontecimentos que se passaram há tanto tempo? Que tipo de pessoa é louca o suficiente para acreditar que ainda há tempo de mudar as coisas com uma segunda chance? A música da Clarice que ele dizia ser nossa, falava da nossa loucura ser tão parecida, então, talvez eu seja esse tipo de pessoa louca.

Nosso encontro não teve um fim decente, nem nossa última conversa, nós Deixamos tudo em aberto, interminado. Até hoje não sei como ele conseguiu meu número de telefone, talvez, como brincávamos, tenha sido o destino, e se for destino, esse mesmo destino se encarregou de me fazer perder o número de telefone dele.

Algumas coisas na vida não fazem sentido, como essa história. Mas eu ainda supero essas coisas e consigo ser mais sem sentido ainda. Qualquer ser humano normal esqueceria essa história e seguiria a vida normalmente. Mas é meio impossível esquecer a pessoa que me apresentou à How I meet your mother, a série que se tornou minha favorita.

Acontece que não sou normal, e apesar de ter seguido a vida, eu ainda me lembro dele e penso nele quase todos os dias, ainda penso que poderia ter dado certo mesmo dando errado. Apesar de não ter mais contato, de não saber como anda a vida dele, ainda assim, deixei a porta da minha vida aberta, caso ele queira voltar.

Pode dizer que sou louca por deixar a porta aberta e esperar alguém que provavelmente partiu e não pensa em voltar. Podem me achar louca, mas meu personagem preferido costuma dizer que as melhores pessoas são assim, loucas. 
Isadora Martins

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